sexta-feira, outubro 15, 2010

Partidos divergem quanto às medidas contra o “enchimento das urnas”

Propostas de revisão da legislação eleitoral

As bancadas parlamentares concordam que as eleições se realizem sempre em Outubro, mas divergem quanto às datas: o MDM propõe que a votação seja sempre a 12 de Outubro; a Frelimo na primeira semana de Outubro; e a Renamo no segundo domingo do mesmo mês.
Os três maiores partidos do país, nomeadamente, a Frelimo, Renamo e o Movimento Democrático de Moçambique (MDM) não se entendem quanto às formas a adoptar para eliminar o suposto fenómeno de enchimento de urnas levantado, sobretudo, pelos partidos da oposição, depois das eleições e visto como uma das causas do seu insucesso.
Numa altura que se fala da revisão da lei eleitoral e, perante as sistemáticas queixas de haver evidências de enchimento de urnas nas assembleias de voto para favorecer determinados concorrentes às eleições, os partidos representados na Assembleia da República viram uma oportunidade para apresentar uma nova redacção ao artigo sobre o suprimento de divergência no que diz respeito à contagem dos votos nos pleitos eleitorais. Trata-se do artigo 85 da lei 7/2007 de 26 de Fevereiro: lei da eleição do presidente da República e dos deputados da Assembleia da República. No entanto, as visões são diferentes: no seu projecto de lei, o MDM recomenda à anulação do resultado da votação sempre que o número de boletins de voto depositados na urna duma determinada assembleia de voto e o número de eleitores recenseados e listados para votarem nessa mesma urna não conferir.
A Renamo, por sua vez, traz uma fórmula diferente e baseada em conferência dos números dos boletins de votos que devem ser comparados aos respectivos canhotos. Por isso, o projecto estipula: “em caso de divergência entre o número de votantes e os boletins de votos procede-se à verificação numérica sequencial dos boletins depositados na urna. De seguida, confrontam-se os referidos boletins com a numeração sequencial existente nos canhotos e os que não conferem com a sequência numérica dos canhotos com os boletins de voto encontrados na urna são considerados nulos e de nenhum efeito, sendo excluídos das operações de apuramento parcial”.
Quem parece indiferente é a Frelimo. Esta bancada é simplesmente pela manutenção do actual texto do artigo 85. No seu projecto diz que “em caso de discrepância entre o número de boletins de voto existentes na urna e o número de votantes, vale, para efeitos de apuramento, o número de boletins de voto existentes na urna”. Ou seja, o partido defende a manutenção taxativa e igual do conteúdo da actual lei.

O que está por detrás de cada projecto?

A Frelimo, ao sugerir a manutenção da actual redacção do artigo em causa, mantém, igualmente, a actual polémica em relação ao enchimento de urnas a ele associado e nada faz para reverter os comentários da oposição, que o acusam de ganhar eleições graças a boletins de votos introduzidos nas urnas pelos membros das mesas de voto a seu favor.
Analisando o projecto da Frelimo, somente se pode anular a eleição numa dada assembleia de voto se, e só se, o número de boletins de voto numa urna for superior ao número dos inscritos. Conclusão: ainda que haja enchimento de urnas, se o número de boletins de voto dentro da urna não for superior ao número dos inscritos, não se está perante uma infracção.
A Frelimo, fazendo um jogo prudente e para atenuar esse risco, mais adiante, mostra-se cautelosa ao sugerir que, em caso de indícios de enchimento de urnas, seja adiado o apuramento: “se o número de boletins de voto existente na urna for maior que o número de eleitores inscritos, o edital dessa mesa da assembleia de voto é publicado no local, não sendo, porém, processado para efeitos de apuramento”, E acrescenta: “a irregularidade referida no número anterior acarreta procedimento criminal contra os implicados”.
Contudo, a Renamo e o MDM, quiçá com lições amargas aprendidas, são peremptóricos ao apelar à anulação imediata dos resultados da votação sempre que haja provas de enchimento de urnas. A medida sugerida pela Renamo poderá ser fiável no combate ao suposto enchimento de urnas, pois vai permitir que mesmo em situação em que o enchimento não tenha sido superior ao números dos eleitores inscritos nos cadernos eleitorais se detecte se houve ou não enchimento de urnas.
O mesmo poderá ser feito através da verificação dos números e da sequência dos boletins de voto. Se esta não “bater” com os canhotos, poderá-se confirmar os indícios de enchimento de urnas e proceder-se à anulação imediata da votação.

MDM “atropela” CRM e propõe data fixa para as eleições gerais

Todos os partidos concordam com o mês de Outubro, mas divergem no concerne à marcação da data e do dia em que devem ocorrer as eleições no país.
O Movimento Democrático de Moçambique sugere que o dia do professor (12 de Outubro) passe, doravante, a servir como data das eleições em Moçambique. Na óptica do MDM, havendo uma data fixa e desde logo conhecida, torna-se simples para os partidos se prepararem para participar nos escrutínios e obedecer aos prazos de todos os actos eleitorais.
Contudo, o projecto-lei desta formação política pode chocar com o ditame constitucional que consta do artigo 159, segundo o qual cabe ao presidente da República convocar as eleições gerais. Ora, existindo uma data fixa prevista na lei eleitoral (no caso em apreço, 12 de Outubro) furta-se ao presidente da República a sua competência para marcar quando é que devem ser realizadas as eleições gerais. Como consequência, torna-se igualmente impertinente que a lei fixe o mínimo do tempo de antecedência para a marcação da data. Essa proposta abre espaço para que a lei eleitoral (lei ordinária) esteja acima da lei-mãe, (a constituição) o que pode violar o dispositivo segundo o qual as normas constitucionais prevalecem sobre todas as restantes normas do ordenamento jurídico.
Esquivando atropelos à lei-mãe, a Frelimo, no seu projecto de lei, define a data das eleições doutra forma: “Ressalvado o estabelecido na Constituição da República, as eleições presidenciais e legislativas realizam-se até à primeira semana de Outubro de cada ano eleitoral, em data a definir pelo Presidente da República, por decreto, com antecedência mínima de dezoito meses, sob proposta da Comissão Nacional de Eleições”. Assim dizendo, a Frelimo procurou evitar retirar poderes e competências ao presidente da República constitucionalmente estabelecidos. Dito desta forma, o presidente da República permanece com a competência de convocar as eleições, uma vez que o projecto de lei não define data exacta, mas primeira semana de Outubro. Ou seja, tendo a semana sete dias, caberá ao presidente escolher aquele que lhe apraz. Aliás, à própria CNE não foi retirada a competência de propor ao presidente a data concreta para a realização das eleições.

Renamo quer eleições aos domingos

Já a Renamo entende que domingo é o dia recomendável para a realização das eleições.
Diz o artigo 6 do seu projecto de lei: “as eleições realizam-se, simultaneamente num único dia, em todo o território nacional, no segundo domingo do mês de Outubro do ano que antecede o termo do mandato”.
A definição de um dia de semana fixo para a realização dos pleitos naturais é prática em muitos sistemas eleitorais da região.
Entretanto, a coincidência das eleições com o dia de culto pode tornar-se num fracasso quanto à afluência macissa dos eleitores nas urnas. No caso concreto, o domingo em Moçambique é dia de culto para a maior parte das igrejas cristãs.
O debate sobre a escolha dos dias de semana para a realização das eleições desaconselha os dias de culto, nomeadamente, sexta-feira (dia de culto para os muçulmanos), sábado (para adventistas do Sétimo Dia) e domingo (para a igreja católica e a maior parte das igrejas protestantes).
Assim, para o projecto da Renamo, a realização das eleições no domingo poderá implicar duas situações distintas, a saber: abandono dos cultos religiosos por parte dos cidadãos-crentes para afluírem em massa às urnas e bem cedo; ou inversamente, ausência ou atraso nas eleições para atender aos cultos religiosos. O último cenário, a acontecer, poderá resultar em longas bichas só no período de tarde, prolongando a votação até ao período da noite. (Sérgio Banze)

Fonte: O País online - 15.10.2010

Reflectindo: mais do que esperarmos problemas eleitorais que um dia poderão ser graves, apelo aos compatriotas para procurarem o melhor a aprovar-se na revisão do pacote eleitoral .

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