quarta-feira, janeiro 29, 2014

Transição de gerações desagrada aos combatentes

Mariano Matsinha é combatente de primeira hora e muito próximo do Presidente da República. Distante dos holofotes da media, mas bastante influente, diz que os grandes temas do partido não podem ser discutidos nos jornais.
Encontrámo-lo num hotel na zona nobre da cidade de Maputo com o seu ipad entre as mãos. Aos 76 anos de idade,Matsinha não é um homem ortodoxo, é flexível e aberto ao uso de novas tecnologias e redes sociais. “Estou no facebook para acompanhar as discussões sobre o país”, respondeu-nos à vontade com os olhos fixos num post. Às perguntas dos jornalistas, Matsinha reage com convicção: não esconde a sua proximidade com o Chefe de Estado, Armando Guebuza; a necessidade de o governo não ceder a Afonso Dhlakama e a decisão de fuzilamento de Urias Simango. A guerra de sucessão e o avanço do MDM são temas que também trata sem reservas. A seguir, as partes mais importantes dessa conversa-entrevista.
Uma carta de membros da Frelimo defende a indicação de mais pré-candidatos, além das três propostas da comissão política. Por que é que a sucessão está a criar tanta tensão dentro do partido?
Pela primeira vez, o candidato não será um combatente da luta de libertação nacional. Teremos um candidato da geração 8 de Março. É isso que está a criar essa confusão toda. Os combatentes, um dia, vão desaparecer. É uma geração que um dia vai desaparecer e a Frelimo não vai morrer por isso. A Frelimo tem de viver, mesmo sem antigos combatentes.
A sucessão de Chissano foi pacífica? 
Foi, porque o Presidente Guebuza é combatente. Agora não está a aparecer nenhum combatente. Um até estudou nas zonas libertadas, o Nyusi. Mas era muito criança.
Há antigos combatentes que não estão preparados para deixar o poder?
Mas se o antigo combatente é um doentio, pode aguentar governar? O nosso presidente é executivo, não é corta-fitas. Isso exige muito esforço e um doentio eu tenho dúvidas que possa exercer bem as funções.
A carta que citamos contesta sobretudo as palavras do secretário-geral da Frelimo, Filipe Paúnde, segundo as quais não há espaço para mais candidatos.
O Comité Central é soberano. O Comité Central aprecia as propostas da Comissão política e, durante a apresentação, pode dizer que nós não queremos estes, mas queremos outros. É ele que decide quem será o candidato do partido.
O Comité Central pode eleger outro candidato...
Com certeza que pode.
Concorda com os três pré-candidatos?
Eu concordo com o candidato que for votado pelo Comité Central. Eu até posso ter uma opinião favorável sobre um pré-candidato, mas ele pode não passar.
Quem seria o seu candidato preferido?
Evito ter candidato preferido.
Porquê?
Eu só quero saber do candidato eleito pelo Comité Central. Esse é que será o meu candidato.
Há uma pressão de que é preciso abrir mais espaço para outras candidaturas...
Aqui em Maputo (risos)...
É uma pressão da sociedade e avança-se alguns nomes, com destaque para Luísa Diogo.
O Comité Central pode decidir que queremos Luísa Diogo.
Vai apoiá-la?
Basta ela ser eleita pelo Comité Central, eu apoio Luísa Diogo. Apoio qualquer um que for eleito pelo Comité Central. Não terei nenhuma hesitação.
Acredita que ela pode ser eleita pelo Comité Central?
Não sei, mas tudo pode acontecer. Não importa se é homem ou mulher. A Luísa Diogo até é da minha tribo lá em Tete (risos). Mas isso não importa.
Concorda que a sucessão no partido não diz respeito apenas aos membros da Frelimo, dadas as responsabilidades que ela tem com a sociedade?
Não. Cada partido escolhe o seu candidato. A Renamo escolhe o seu candidato, MDM escolhe o seu candidato, Alice Mabota também se apresenta como candidata. Cada partido é soberano de apresentar o seu candidato. O povo pode dizer  não a este candidato e preferir o outro. O povo é soberano nas eleições. Mas dentro da Frelimo, o soberano é o Comité Central.
Como cidadão, sente que há algum descontentamento em relação aos três pré-candidatos a candidato...
Há descontentamento e há contentamento.
Os membros da Frelimo queixam-se de asfixia no partido...
A asfixia é uma coisa psicológica que as pessoas têm. Se realmente as pessoas têm opiniões, podem apresentá-las às estruturas do partido.
Jorge Rebelo, por exemplo, disse numa entrevista que já não há crítica na Frelimo.
No tempo de Samora, ele era membro de bureau político. Se tu não és membro do Comité Central, realmente podes ter alguma dificuldade de se aproximar das estruturas do partido. Eu compreendo isso e, se um dia ficar fora do Comité Central, não terei o livre acesso que tenho hoje.
Dentro do Comité Central há espaço para várias opiniões?
Então, quando a gente reúne o Comité Central é para fazer o quê? É para dizer sim, sim, sim...?(risos).
Não é o que tem acontecido? Muitas ovações...
(Risos) Isso não é verdade. Eu sou membro do Comité Central.
Há debate?
Há debate, sim, senhor.
Há uma ideia de que o Presidente não é uma pessoa que aceita a crítica.
Talvez seja por causa do seu passado. Foi ministro do Interior e é possível que isso ainda esteja a pairar no ar. Mas eu estou perto dele e discutimos muitas coisas. Às vezes, ele não concorda comigo, mas, às vezes, eu não concordo com ele.
Alguma decisão que ele tenha tomado e da qual não concordou?
Não é uma decisão que diz respeito ao país. São questões de natureza partidária e eu não vou revelar aqui.
Disse, numa entrevista ao jornal Público, que estava desiludido com Pascoal Mucumbi. O que aconteceu?
Eu não estou desiludido com as ideias que ele tem. Estou desiludido com o método que ele usa para colocar as suas ideias sem ter contactado as estruturas do partido. Ele teria sido bem recebido pelo partido. Ele poderia ir falar com o presidente do partido. 
Se calhar ele vê nos jornais e nas cartas únicos meios para expor as suas ideias...
Talvez seja isso. Quando eu tenho coisas aflitivas, vou ter com o Presidente e informo que a minha posição é esta.
Há uma ideia de que os combatentes usam as influências para fazer negócio. Tem algumas empresas? 
Eu não faço negócio e com 76 anos sinto-me cansado para isso. Mas sou presidente da assembleia-geral de algumas empresas: Ceta, Engco e Emose. Dão-me alguma coisa.
Mas quando olha para outros combatentes que têm muitas empresas, como é que se sente?
Eu não sei se têm muitas empresas.
O Presidente, por exemplo, diz-se que é um grande empresário...
É o que dizem. Sabes o que ouvi em Tete? Que LAM é do Presidente, Vale é do Presidente, HCB é do Presidente, Mpanda Nkuwa é do Presidente. Quer dizer, tudo é do Presidente! Eu penso que a oposição está a usar isso para aproveitar a ignorância da população.
Mas ele tem empresas...
Tem uma empresa. Até estava a dirigir essa empresa antes de ser Presidente.
Numa entrevista ao jornal SAVANA, Sérgio Vieira disse que, caso o MDM chegue ao poder, pode manifestar um sentimento de vingança. Mariano Matsinha esteve na área de Segurança, teme alguma vingança?
Quando Urias Simango morre, eu ainda não estava no ministério de Segurança. Nessa altura, acho que era ministro residente em Sofala.
Mas acompanhou as circunstâncias em que ele foi morto...
Olha, eu só soube quando cheguei ao ministério, lendo os documentos. 
E, como foi a morte de Simango, com base nesses documentos?
(silêncio)Olha, ele foi fuzilado. A decisão foi da Frelimo, antes da independência.
Que decisão?
Fuzilamento dos traidores. A gente fuzilava. Não poupávamos, a nossa guerra não era de brincadeiras. Quem pisasse a nossa linha era punido.
Hoje voltaria a fazer a mesma coisa?
Não, as circunstâncias são diferentes. Pena de morte foi abolida há muito tempo.
Como é que se sente hoje quando cruza com pessoas que perderam seus parentes por fuzilamento?
Eu não as conheço.
Os filhos de Urias Simango, por exemplo.
Eu dou-me bem com eles. Converso normalmente com eles. Quando eu era deputado, Lutero Simango estava na minha Comissão do fórum parlamentar da SADC. Viajávamos juntos e conversávamos à vontade.
Nunca tocavam nesses assuntos?
Não, não tocávamos nesses assuntos.
Ainda assim, não receia um sentimento de vingança?
Se eu tivesse receio, não teria ido à luta armada. Se eu tivesse medo de morrer, não havia de abandonar o meu curso de engenharia em Portugal. Hoje, eu seria engenheiro.

Fonte: O País online - 30.01.2014

2 comentários:

Anónimo disse...

Acho k o senhor Matsinha é um exemplo evidente daques que têm medo de espressar o seu pensamento por represarias e ainda chama decepsiona-se com aquelas que livremente falam sem medo. O senhor Mocumbi desde o periodo preparatorio da luta de lidertaçao nacional foi sempre livre de falar oque pensa, talvez porque tinha proteçao do entao presidente Joaquim Chissano por ser do sul de moçambique,lembrando. Se fosse de outra parte do pais talvez nao teria a mesma sorte e teria sido fuzilado como tantos outros que sucumbiram por serem criticos e de etnia diferente a dos do sul de moçambique. Lembrando tambem que foi pela perseguiçao que foi a portugal estudar. Ate quando moçambique vamos viver governados por esta geraçao canibalica? Ate quando teremos que viver humilhados amedrontados e sem direito a expressao e opiniao no nosso pais?
O senhor Matsinha nao quer admitir que o presidente da republica seja dono de muitas empresas e por cima disso chama do povo moçambicano de ignorante. Tem ideia do que isso significa chamar a mim e tantos outros como eu de ignorantes? Acha mesmo que nós o povo moçambicanos nao sabemos doque esta a se passar no pais. Acha que o povo moçambicano nao sabe que os contratos com os mega projectos nao trazem nenhum beneficio ao povo moçambicano se nao uma menoria pertencentes ao governo deste pais? Isso é oque ele chama se ser ignorante? Aconselho o senhor combatente Matsinha a pensar bem antes de falar

Anónimo disse...

Afinal o povo mocambicano e ignorante? Eu penso que merecemos respeito. E este mesmo povo que voces insultam que qmqnha vai vos votar para estarem no poder. Respeitem o povo por favor